Pacientes que precisam de um transplante quase sempre têm de vencer 
dois obstáculos sérios: em primeiro lugar, a escassez de órgãos, já que 
os doadores ainda são relativamente raros; e, mesmo quando uma operação 
ocorre, há o risco de rejeição do órgão transplantado.
Para contornar esse problema duplo no caso dos transplantes de pele, 
uma equipe que reúne cientistas britânicos e brasileiros está usando 
técnicas que transformam tecidos suínos num material compatível com o 
organismo humano.
Além do emprego em queimados, a matriz poderia ser usada também para 
recuperar a pele de pessoas afetadas por tumores, hérnias ou feridas de 
difícil cicatrização.
Andaime biológico
Sonia Oliani, bióloga da Unesp de São José do Rio Preto que coordena a
 vertente brasileira da pesquisa, usa uma palavra inglesa muito 
empregada em estudos de engenharia de tecidos para explicar a função da 
pele suína: ela é um scaffold - literalmente, "andaime".
O tecido animal serve, portanto, como uma estrutura de apoio para que o organismo reconstrua com eficácia a área de pele lesada.
O passo mais importante para que esse andaime seja seguro e não coloque em polvorosa o sistema imunológico do paciente transplantado é eliminar as células do porco "doador".
O chamado processo de descelularização da pele suína, conduzido pelos
 colegas da pesquisadora na Universidade College de Londres, é um 
daqueles proverbiais segredos guardados a sete chaves, já que se trata 
de técnica protegida por patente.
"Nem posso falar muito dele", acautela-se Oliani. "O que dá para 
dizer, no entanto, é que o procedimento remove todo o material genético 
associado ao tecido suíno. Resta, no fim do processo, uma matriz sem 
células que, a julgar pelo que indicam os dados preliminares de 
laboratório, conserva as principais características biomecânicas e 
estruturais da pele real".
Entre os principais componentes da matriz estão o colágeno, velho 
conhecido de quem já assistiu a comerciais de produtos de beleza para a 
pele, e o não tão célebre ácido hialurônico
 (cujo uso cosmético também tem-se tornado frequente). Ambas as 
moléculas são peças cruciais do sistema de "preenchimento" entre as 
células da pele e de diversos outros órgãos, conferindo elasticidade e 
vigor ao tecido.
Na pele, as moléculas de colágeno aparecem em conjuntos de fibrilas, 
as quais, junto com a queratina, conferem ao tecido suas propriedades 
mecânicas naturais e, quando em menor abundância ou qualidade, levam às 
rugas. Já o ácido hialurônico age como promotor da migração e 
proliferação celular, além de ajudar a manter o colágeno em boas 
condições.
Bancos de pele
Demonstrar a eficácia desse tipo de tecnologia, bem como sua 
viabilidade econômica, seria particularmente importante no contexto 
brasileiro, afirma a bióloga, porque os bancos de pele,
 com tecido proveniente de doadores humanos, são raros, estando 
presentes apenas na capital paulista, em Porto Alegre e no Recife.
A equipe de São José do Rio Preto está chegando ao fim da primeira 
fase de testes da pele descelularizada, realizada com ratos da linhagem 
Wistar, uma das mais utilizadas na pesquisa biomédica. "Já estamos 
retirando e examinando os primeiros implantes e transplantes, passados 
quatro meses desde a operação inicial", afirma Sonia.
Outros estudos de engenharia tecidual têm trabalhado com estratégias 
mais complexas, nas quais o andaime é "pré-semeado" com células-tronco 
capazes de dar origem ao tecido que se deseja reconstruir antes de a 
estrutura ser colocada no organismo receptor. Mas a bióloga diz que o 
plano, por enquanto, é estimular a capacidade de regeneração natural.
Anexina A1
Enquanto aperfeiçoa o uso da matriz de pele suína, a equipe da Unesp 
também investiga uma molécula que pode se revelar uma poderosa aliada 
dos transplantes.
Trata-se da proteína anexina A1, que tem propriedades 
anti-inflamatórias e facilita a proliferação celular, essencial quando 
as conexões entre o tecido transplantado e o organismo receptor estão 
sendo construídas.
Sônia trabalha há anos com o britânico Roderick Flower, descobridor 
da anexina A1 e professor de farmacologia da Universidade Queen Mary.
"A ideia é administrar a anexina antes do transplante, o que já vai 
proteger o organismo de parte dos efeitos da operação e facilitar a 
recuperação estrutural e os processos regenerativos do órgão", diz 
Sonia. Há resultados encorajadores dessa estratégia em transplantes 
renais, por exemplo. "Estamos aproveitando esse trabalho nos nossos 
estudos com transplantes de pele", diz ela.
Fonte: Diário da Saúde 
 
 
 

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